li em algum lugar da internet que o cérebro humano fica vivo por 7 minutos após a nossa morte. diz a teoria que esses 7 minutos de atividade existem para que o nosso cérebro possa relembrar suas memórias mais felizes.
não procurei saber se a teoria é verdadeira, comprovada cientificamente ou sequer se há algum tipo de respaldo nas crenças populares. escolhi acreditar que sim. pelo menos enquanto escrevo isto.
se você morrer hoje, que lembranças vão ocupar os seus 7 minutos?
a maioria de nós, tenho certeza, vai se lembrar de momentos simples com pessoas queridas; de um afeto recebido ou trocado em forma de comida, afago, risada; de uma conquista importante, suada; de um animal de estimação, talvez vários.
vamos convenientemente deixar de lado todas as horas que nos preocupamos com o futuro ou que remoemos o passado para, assim, canalizar somente as memórias pelas quais valeu a pena estar vivo, presente.
se esses 7 minutos pudessem ser assistidos como uma obra cinematográfica, o operador de câmera (que, coitado, ocupa uma posição tão facilmente esquecida), seria a nossa capacidade de estarmos presentes — uma habilidade que também é frequentemente desprezada, dada nossa predileção pela abstração.
é preciso esquecer
esqueço-me facilmente das coisas que me doeram; sei que nem todos são assim, e sei também que este é um mecanismo imperfeito das minhas defesas emocionais, mas vejo nessa característica também um aspecto luz: é porque esqueço algumas partes de mim, que tenho espaço para construir partes novas.
lembro-me vagamente dos momentos em que estive distraída: assistindo vídeos, programas de TV, conversando fiado, falando mal de alguém. lembranças vagas não valem meus 7 minutos de atividade cerebral pós-morte.
as lembranças que me são inteiras são sempre aquelas que se construíram com a minha presença. mesmo que não sejam tão extraordinárias ou leves.
sei lá se vou poder escolher o que lembrar, provavelmente não. mas me contento em imaginar que terei o que assistir enquanto a mórbida e vazia sensação de ‘fim’ me digerir.
e este é um privilégio pelo qual, nos dias de hoje, se tem que lutar. estar presente é um luxo. poucos têm consciência disso.
quando eu morrer, me conhecendo, eu provavelmente vou me sentir realizada. sou mais curiosa do que temerosa com a morte. como qualquer pessoa, no entanto, temo o sofrimento. mas saber que vou morrer é lembrar que ele é sempre passageiro.
e como tudo que passa, os 7 minutos também serão efêmeros, assim como as melhores músicas que já ouvi. esses, porém, não poderei colocar para repetir. então que eu saiba sempre fazer minha vida valer a pena agora, pra que eu não dependa somente de algumas poucas memórias a preencher o vazio da minha morte.
quando eu morrer, se alguém atender meu funeral, quero que toquem no assunto. quero que minhas orelhas frias (então somente carne e cartilagem), possam presenciar o falatório sobre a morte como um evento qualquer, pois é isso o que ela é. um evento absolutamente comum. e eu detesto não poder conversar mais sobre ela em vida.
mas antes disso, ainda, quero que minha vida sirva uma finalidade simples: o incentivo à presença. ela é o único antídoto para a morte. é ela quem nos permite lembrar.
eu espero que seus 7 minutos sejam satisfatórios. e obrigada pela presença até aqui.
Acho que se eu morrer hoje, vou passar os 7 minutos imaginando como serão todos os próximos